“É imprescindível o Estado integrar e bonificar novas coberturas e apólices de seguros”
Em Portugal, “apenas cerca de 25% dos agricultores recorrem aos seguros como forma de mitigar risco” e, por essa razão, as tarifas são “elevadas, repercutindo-se no preço final”. Em entrevista à “Vida Económica”, Lino Afonso, diretor da área agrícola da Caixa Agrícola Seguros, é taxativo: “as companhias de seguros estão recetivas a uma maior adesão aos seguros agrícolas” e “disponíveis para estudar e colaborar na criação de novas coberturas” para responder às alterações climáticas. Mas, para isso, é “imprescindível o Estado estar recetivo a integrar e bonificar estas coberturas e apólices”.
Vida Económica – Será este o momento de lançar uma campanha de sensibilização para uma maior adesão aos seguros agrícolas?
Lino Afonso - As alterações climáticas estão a fazer-se sentir com alguma rapidez e acutilância, levando a uma constante alteração das necessidades sentidas pelos agricultores, entre elas, coberturas orientadas para a seca. Os principais riscos do passado (geada) não são os do presente (granizo) e não serão os do futuro (escaldão e seca). O mercado ainda não dispõe de seguros para a seca, embora, em meu entender, seja um assunto que merece a atenção e preocupação de todos os intervenientes, como sejam o Estado, em primeiro lugar, as seguradoras, em segundo lugar, e por fim os agricultores. Só será possível criar algo se existir vontade por parte de todos os intervenientes.
VE - A CA Seguros tem algo pensado a este nível?
LA - A CA Seguros criou a cobertura de ‘Escaldão’, mas levou aproximadamente cinco anos a estudá-la em conjunto com o Instituto Superior de Agronomia. Para a criação e implementação de novas coberturas, é necessário algum tempo de estudos para obtenção de informação estatística e, sobretudo, vontade política e meios financeiros para o efeito. No anterior sistema, existia um mecanismo chamado ‘Fundo de Calamidades’, o qual visava dar resposta a fenómenos que não estivessem a coberto das apólices, entre eles a seca. Com o desaparecimento deste mecanismo, ficamos sem resposta para este tipo de eventos.
VE - Os seguros agrícolas disponíveis no mercado dispõem deste tipo de coberturas ou terão de ser lançados novos produtos para responder a estes novos desafios relacionados com as alterações climáticas?
LA - A CA - Seguros está disponível para estudar e colaborar na criação de novas coberturas, embora, para tanto, seja imprescindível o Estado estar recetivo a integrar e bonificar estas coberturas e apólices. A prova disto é o facto de termos no nosso portefólio uma apólice de ‘Seguro Pecuário’, uma apólice de ‘Incêndio Florestal’ e uma outra de ‘Incêndio Agrícola’. Qualquer delas é pouco utilizada, dado que o Estado não apoia nenhuma delas, quer ao nível das bonificações, quer, inclusive, ao nível de resseguro. Posso adiantar-lhe que, nestes três produtos, não chegam a 150 contratos que dispomos. Numa fase em que o país saiu de um verdadeiro pesadelo com os incêndios do passado verão, seria uma altura propícia, no âmbito dos novos investimentos, apoiar uma apólice de incêndio florestal ou agrícola com vista a mitigar os riscos inerentes.
VE - Qual é o número de apólices de seguros contratadas com a CA Seguros neste momento? E essencialmente para que tipo de coberturas?
LA - A CA - Seguros contrata anualmente qualquer coisa como 1100 apólices de colheitas, sendo a sua maioria em vinha, algumas fruteiras e uma parte significativa em olival e horticultura. Dado que muitas destas apólices são uniformes (elaboradas e comparticipadas pelo IFAP), não permitem a inclusão de outras coberturas para além daquelas que são usuais, como o tornado, tromba de água, quedas de neve, incêndio, granizo e queda de raio.
VE - Tendo em conta a situação grave que se vive em Portugal devido à seca, crê que as companhias de seguros estarão recetivas a uma maior adesão aos seguros agrícolas?
LA - As companhias de seguros estão recetivas a uma maior adesão aos seguros agrícolas. Aliás, um dos problemas com que se confrontam é justamente a baixa adesão, pois apenas cerca de 25% dos agricultores em Portugal recorrem aos seguros como forma de mitigar risco. Verifica-se também a chamada ‘anti-selecção’, isto é, só faz seguro quem tem elevado risco, o que leva a que as tarifas sejam elevadas, repercutindo-se no preço final.
VE - E é expectavel que o custo das apólices suba devido a esse facto?
LA - Se a adesão fosse superior, tendencialmente, os preços seriam mais baixos. Posso afirmar que, para ter uma agricultura empresarial e competitiva, é necessário um bom sistema de seguros e, para que isso aconteça, é necessário o Estado estar disponível ,apoiando e incentivando a sua utilização.