Fim das moratórias vai aumentar as insolvências;

Raposo Subtil considera
Fim das moratórias vai aumentar as insolvências
“É fundamental que as empresas antecipem a gestão do fim das moratórias”, afirma Raposo Subtil.
“Apesar das medidas adotadas terem permitido um alívio momentâneo nas economias das empresas e das famílias, os efeitos da aplicação dos regimes das moratórias não serão propriamente positivos”, afirma Raposo Subtil que prevê um aumento das insolvências quando aqueles terminarem.
“É fundamental que as empresas antecipem a gestão do fim das moratórias”, “iniciando a elaboração de um plano de negócios, bem como a respetiva reestruturação interna, societária e financeira”, acrescenta o advogado e coordenador da RSA LP.
RERE (Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas, PER (Processo Especial de Revitalização) e PEVE (Processo Extraordinário de Recuperação de Empresas) podem permitir às empresas negociar com os seus credores e aprovar um acordo de reestruturação do passivo

Vida Económica - Qual vai ser o Impacto do fim das moratórias nas empresas e nas famílias?
Raposo Subtil -  Para algumas empresas e famílias, o alívio temporário do serviço da dívida proporcionado pela adesão à moratória foi complementado com a contratação de novo crédito, recurso a linhas de apoio, para assim garantir o financiamento necessário à sua atividade corrente.
A implementação de regimes de moratórias e linhas de crédito ajudou as empresas e as famílias a ultrapassar o período mais crítico da pandemia evitando situações de incumprimento, permitindo um adiar do serviço da dívida, mas o fim destes regimes, assim como uma retoma mais lenta podem ter impactos negativos. Haverá agentes económicos que, sobrevivendo a curto prazo, não vão conseguir recuperar e restabelecer o seu equilíbrio financeiro e económico, pelo que o fim do regime de moratórias poderá tornar-se no próximo grande desafio da economia
Atendendo à percentagem de entidades (empresas e particulares) que, até à data, recorreram às moratórias e aqueles que ainda o poderão fazer, face ao crédito total concedido, é expetável, que as restrições de liquidez enfrentadas pelas empresas sofram um novo agravamento atendendo ao termo da moratórias e há necessidade de iniciar o pagamento das linhas de apoio entretanto recebidas, mostrando-se incapazes de fazer face ao seu serviço de dívida e honrar as suas responsabilidades.
Assim, num cenário em que a pandemia continuará a afetar a retoma da atividade económica, haverá, necessariamente, a diminuição da capacidade, por parte das empresas e das famílias, em proceder ao pagamento das dívidas, que serão ainda mais avultadas, o que poderá ditar um maior número de insolvências a médio prazo.
Pelo que, apesar das medidas adotadas terem permitido um alívio momentâneo nas economias das empresas e das famílias, os efeitos da aplicação dos regimes das moratórias não serão propriamente positivos.
VE - Quais são as estratégias a delinear pelas empresas para que, com o fim das moratórias e com a situação económica desfavorável do país, consigam recuperar?
RS - As empresas devem, proceder a um diagnóstico interno, frontal e transparente, da sua situação financeira atual e futura antevendo este cenário e iniciando a elaboração de um plano de negócios, bem como a respetiva reestruturação interna, societária e financeira.
Nesta perspetiva é fundamental que, de forma proactiva iniciem desde já negociações com os seus credores, designadamente, com as instituições financeiras, por forma a atenuar os efeitos que poderão advir de uma situação de impossibilidade de cumprimento das suas obrigações no termo do período das moratórias.
É fundamento que as empresas antecipem a gestão do fim das moratórias. Mesmo que ainda tenham alguns meses de alívio, o ideal será começar, o quanto antes, a preparar o futuro e o momento em que o pagamento do crédito vai ser retomado.
As empresas têm, ainda, à sua disposição e tendo em vista a implementação das necessárias medidas de reestruturação para garantir a manutenção ou retoma de atividade, diversos mecanismos de recuperação judiciais e extrajudiciais.

VE - Que meios judiciais e extrajudiciais têm as empresas, atualmente, ao seu dispor?
RS - Estes mecanismos são RERE (Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas, o PER (Processo Especial de Revitalização) e o PEVE (Processo Extraordinário de Recuperação de Empresas). Todos estes procedimento que permitirão negociar com os seus credores e aprovar um acordo de restruturação do passivo, evitando, que a empresa termine numa situação de incumprimento generalizado de obrigações, decorrente da sua falta de liquidez e consequentemente numa eventual situação de insolvência.
Estes mecanismos tem, como referência comum, tratarem-se de processos que visam a negociação com os credores tendente a aprovação de um plano de recuperação que vise a sua reestruturação e viabilização.

VE - No que consiste o Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas?
RS - O Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) é um procedimento extrajudicial que decorre sem intervenção do Tribunal e que pode desenvolver-se apenas com parte dos credores da entidade devedora, devendo iniciar-se com a adesão de pelo menos 15% do seu universo de credores.
Como referi corre foram dos tribunais e inicia-se com a celebração de um protocolo de negociação a depositar na CRC competente, decorrendo posteriormente um prazo máximo de três meses de negociações que deve culminar na celebração de um acordo de recuperação, também ele a ser depositado na CRC para produzir efeitos.
Uma das vantagens enunciadas para este processo é o fato de ter natureza confidencial, contudo, o fato de apenas vincular os credores subscritores do Acordo e de exigir a reestruturação de pelo menos 30% do passivo para poder beneficiar dos benefícios fiscais previstos no CIRE tem desmotivado as empresas a recorrer ao mesmo.

VE - O Processo Especial de Revitalização continua a ser uma alternativa?
RS - Para recorrer a este processo, a empresa deve apresentar no tribunal competente, o Tribunal de Comércio, além do requerimento inicial e de um rol de documentos relacionados com a sua atividade (p.e. relação de credores, lista de ativos, relatórios e contas):
a) Declaração subscrita há não mais de 30 dias por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas (sempre que a revisão de contas seja legalmente exigida), atestando que a empresa não se encontra em situação de insolvência atual, à luz dos critérios previstos na lei;
b) Declaração subscrita pela empresa e por credores que, não estando especialmente relacionados com aquela, sejam titulares de, pelo menos, 10% de créditos não subordinados manifestando vontade de encetarem negociações conducentes à revitalização, por meio da aprovação de plano de recuperação;
c) Proposta de plano de recuperação acompanhada, pelo menos, da descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa.

O plano de recuperação a propor aos credores deve conter medidas que visem restabelecer a viabilidade económico-financeira da empresa, das quais são exemplo:
•    O perdão ou redução do valor dos créditos, quer quanto ao capital, quer quanto aos juros;
•    O condicionamento do reembolso de todos os créditos, ou de parte deles, às disponibilidades da empresa;
•    A modificação dos prazos de vencimento ou das taxas de juro dos créditos;
•    A constituição de garantias;
•    A dação em cumprimento e a cessão de bens aos credores;
•    O aumento do capital social, em dinheiro ou em espécie, a subscrever por terceiros ou por credores, nomeadamente mediante a conversão de créditos em participações sociais;
•    A redução do capital social para cobertura de prejuízos.

Após a presentação do requerimento inicial e da nomeação do administrador judicial provisório, e apresentação de créditos por parte dos credores inicia-se uma fase de negociação que terminará com a apresentação de um plano, o que será submetido à votação dos credores.
De salientar que durante este período de negociação suspendem-te todas as acções judiciais tendente à cobrança de crédito.
Se o plano de recuperação for aprovado pelos credores, o juiz decidirá se o homologa, sendo que o mesmo vincula a empresa e todos os seus credores (mesmo os que não hajam participado no PER), relativamente aos créditos constituídos até à data da nomeação do administrador judicial provisório.
As empresas que já se hajam submetido a um PER concluído com a homologação de plano de recuperação estão impedidas de recorrer novamente ao PER pelo prazo de dois anos, a não ser que demonstrem que executaram integralmente o plano ou que o requerimento de novo PER é motivado por fatores alheios ao próprio plano e a alteração superveniente é alheia à empresa.
Afigurando-se evidente que nenhum plano de recuperação poderia ter antecipado o colapso de atividade provocado pela COVID-19 e que as advenientes dificuldades económicas não são imputáveis à empresa, assim nas circunstâncias atuais, entendemos que é defensável que a referida limitação temporal não tenha aplicação, podendo a empresa reiniciar negociações com os seus credores no âmbito de um novo PER, sem ter de aguardar pelo decurso dos dois anos, caso não haja incumprimentos anteriores a situação de pandemia.

VE - O Processo Extraordinário de Viabilização de Empresas em que casos se aplica?
RS - O PEVE surge como uma das medidas previstas no PEES (plano de estabilização económica e social) para fazer face as consequências da pandemia do COVID 19.
Este processo não é muito distinto do PER, designadamente do PER abreviado já previsto no artº 17-I
E um processo judicial temporário, que se prevê vigore apenas até dezembro de 2021, de natureza extraordinária e urgente, que se destina exclusivamente a empresas que se encontrem em situação económica difícil ou de insolvência, em virtude da pandemia da Covid-19 mas que, ainda assim, sejam suscetíveis de recuperação.
Exige-se como pressuposto que estas empresas tenha registado em 31 de Dezembro de 2019 um “ativo superior ao passivo”
 E visa, igualmente, a homologação de um acordo de reestruturação de dívida.
Acordo esse, a ser estabelecido extrajudicialmente entre a empresa e os seus credores, devendo estes representar a maioria necessária para aprovação nos termos do regime previsto para o PER.
Tendo caráter urgente, este processo assume prioridade sobre a tramitação e julgamento de processo de insolvência, de processo especial de revitalização e de processo especial para acordo de pagamento, a fim de garantir que seja tramitado de forma particularmente célere, encurtando-se, também, os prazos e suprimindo-se a fase para reclamação de créditos, com o intuito de acelerar a viabilização das empresas afetadas pela pandemia da Covid-19.
No âmbito do PEVE, destaca-se, ainda, a previsão expressa da possibilidade de redução da taxa de juros de mora, no âmbito de acordo homologado conducente à consolidação financeira da empresa.
Em termos de instrução documental, exige-se para aceder a este processo, para além da documentação já exigida para apresentação a PER, que a relação de credores apresentada seja, subscrita e datada, há não mais de 30 dias, pelo órgão de administração da empresa e por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas, sempre que a revisão de contas seja legalmente exigida e a declaração que ateste o impacto da pandemia Covid-19 sobre a sua atividade;

VE - Qual a vantagem de apresentação imediata das empresas a mecanismos de recuperação em momento anterior ao termo das moratórias?
RS - A vantagem da antecipação do cenário que resultará do fim das moratórias e do seu impacto na tesouraria e na atividade das empresas e a apresentação a um destes mecanismos é a possibilidade de poder reestruturar os seus créditos em momento anterior ao seu incumprimento, podendo implementar essas medidas, apenas, após o termo das moratórios, garantindo uma retoma de atividade adequada as as suas necessidades, beneficiando ainda dos benefícios fiscais previstos nos artºs 268 e seguintes do CIRE, designadamente no que respeita a isenção de IRC, IMT e IS, na implementação das medidas previstas no plano, p.e, nas dações em pagãmente, reforços de garantias, alienação de ativos, etc…..
Assim e antevendo as consequências do fim das moratórias já referidas, as empresas devem, no meu entendimento e após efetuarem o diagnóstico da sua situação económica, equacionar o recurso a um destes mecanismos como medida preventiva, evitando situações descontroladas de insolvência.

VE - Quais as desvantagens de, antecipando-se uma situação  de incapacidade de fazer face ao pagamentos dos seus crédito, apenas de apresentar a um PER ou PEVE depois de terminar o período das moratórias?
RS - Nessa altura podem vir a ser declarados os incumprimentos, vencimentos antecipados, etc… e portanto nessa data as empresas, pessoas singulares devedoras já estarão em situação de verdadeiro incumprimento.
Pelo que a frustração de um PER ou um PEAP (no caso das pessoas singulares) por não se conseguir alcançar a aprovação do plano de revitalização e respetiva homologação, há um risco objetivo deste poder vir a ser convertido num processo de insolvência com a verificação dos respetivos fundamentos, designadamente, o incumprimento generalizado das suas obrigações por falta de liquidez, capacidade para o respetivo pagamento.
Poderá, ainda, ocorrer o risco dos processos ficaram pendentes de decisão judicial oportuna (aumentarem as filas de espera).
Com efeito, vamos verificar um aumento exponencial de processos de recuperação e de insolvência nos tribunais, o que poderá dificultar e atrasar de forma muito significativa a homologação de acordos de recuperação, inviabilizando em muitos casos a sua implementação.

VE - Quais os efeitos da apresentação a PEVE, PER, RERE, ou mesmo a Processo de Insolvência, nos créditos que ainda beneficiam de moratória?
RS - O regime das moratórias prevê que em caso de declaração de insolvência ou submissão a Processo Especial de Revitalização ou Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas da entidade beneficiária, as instituições podem exercer todas as ações inerentes aos seus direitos, nos termos da legislação aplicável.
Ora, salvo melhor opinião, no meu entendimento o que se pretende dizer é que estas instituições não ficam inibidas de reclamar os seus crédito no PER ou no PEVE, caso as entidades beneficiárias a eles se apresentem, e de participar nas negociações que vierem a ocorrer.
Contudo, o seu crédito apenas pode vir a ser reclamado e reconhecido como um crédito sob condição, e essa condição é o incumprimento findo o período de moratória.
Com efeito, como já referi os bancos estão impedidos, durante o período de moratória de declara o incumprimento do contrato ou acionar as cláusulas de vencimento antecipado, pelo que para todos os efeitos os créditos apenas se tornaram exigíveis caso venha a ocorrer uma situação de incumprimento após o período de moratória. Nesta medida permite evitar situações de incumprimentos após esta data, uma vez que nesse momento seriam implementadas as medidas previstas no plano de recuperação alcançado no âmbito de um dos mecanismos de recuperação referidos entrará em vigor.






Susana Almeida, 04/03/2021
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