“Do cerejo ao castanho bem eu me amanho, do castanho ao cerejo é que eu me vejo”;

“Do cerejo ao castanho bem eu me amanho, do castanho ao cerejo é que eu me vejo”
Ana Raquel Caldas Docente do ISAG – European Business School

Do cerejo ao castanho, com mais ou menos máscara, mais ou menos gel, mais ou menos (por vezes muito menos) distanciamento social, a vida foi correndo de feição; as esplanadas permitiram aumentar a capacidade dos estabelecimentos de restauração, o bom tempo proporcionou diversas atividades outdoor, a interrupção das atividades escolares e laborais foi permitindo ir para fora cá dentro, aliviando assim, dessa forma, o stress e a ansiedade não só da população em geral, mas principalmente dos operadores ligados aos ramos do turismo, hotelaria e restauração. E digo aliviando, pois, o impacto das medidas impostas devido à situação provocada pela covid-19 foi devastador. No mês de julho registou-se uma variação negativa de 70,5% nas receitas de aposento, relativamente ao mesmo período do ano anterior (Turismo em números, Turismo de Portugal, I.P., 2020). 

 
Não desfazendo dos outros setores de atividade, mas no setor da hotelaria e restauração, os investimentos em equipamentos e estruturas, representam uma parte muito significativa das responsabilidades, muitas vezes com recurso a empréstimos à banca. Para além disso, tratando-se de prestação de serviços, implica também uma forte componente humana, que se quer que seja especializada, bem formada e experiente. Não esquecer também, que parte significativa dos estabelecimentos de restauração e bebidas são micro e médias empresas, muitas vezes de carácter familiar.

Neste contexto, apela-se à resiliência do setor, com a esperança de que em meados de 2021 será retomada uma trajetória de crescimento. E até lá? Quais as empresas que aguentam esperar até 2021? E os efeitos dos prejuízos acumulados?

Do castanho ao cerejo, o cenário muda de figura. Para pior! O regresso às rotinas familiares, o início de mais um ano letivo, desta vez recheado de incertezas, tantos hábitos novos e a fruta da época, claro está! Quem não vai olhar à sua volta sempre que precisar de tossir?

Este artigo não pretende ser um arauto da desgraça, muito pelo contrário. É antes um enaltecer da nossa capacidade enquanto sociedade de reinventar soluções e de criar oportunidades. As necessidades mudaram. Este é o momento de procurar nichos de mercado. Seja pela via da alimentação saudável que fortalece o sistema imunitário, seja pelas novas tecnologias ao serviço da educação ou então criando soluções para um turismo mais sustentável, afastando-se definitivamente do conceito de massificação do século passado.

A promoção do turismo interno e das escapadinhas de fim de semana pode ajudar a mitigar os efeitos negativos desta crise. Diminuir as assimetrias regionais é uma das metas da Estratégia para o Turismo 2027. Em 2019, as dormidas nas áreas costeiras representaram 84,2% do total nacional, contrastando desta forma com 15,8% das dormidas registadas nas áreas não costeiras. No entanto, se a análise for feita por tipologia de empreendimento, verifica-se que as unidades de Turismo no Espaço Rural e Turismo de Habitação registam 68,3% das dormidas nas zonas não costeiras de Portugal (Estatísticas do Turismo 2019, INE, 2020). O interior do país ainda é um território não saturado, com potencial para o desenvolvimento de um turismo de qualidade, sustentável e não-massificado. Numa fase em que são desaconselhados os grandes ajuntamentos e aglomerados, o “turismo de confinamento” pode surgir como uma solução que satisfaz todos os intervenientes.

A abertura dos corredores aéreos para a Europa e outros destinos é determinante para aumentar a entrada de turistas estrangeiros que, tradicionalmente, nos meses de outubro a maio diversificam os motivos das suas viagens. Diminui o turismo de sol e mar e, no seu lugar, aumentam outros segmentos como turismo cultural, turismo de natureza ou negócios. 

Na Estratégia para o turismo 2027 foram estabelecidas metas, entre as quais aumentar a procura turística nas várias regiões e reduzir o índice de sazonalidade. Foram ainda definidos como ativos estratégicos a Gastronomia e Vinhos e Saúde e bem-estar. Portugal tem uma gastronomia tradicional muito rica, 1860 km de costa, que proporciona dos melhores peixes do mundo, para além da qualidade da restauração e de chefes reconhecidos internacionalmente. Os tão premiados vinhos portugueses são um dos pontos de partida para o Enoturismo. Portugal dispõe ainda de uma elevada concentração de nascentes de água com indicações terapêuticas e outros centros especializados em saúde e bem-estar, aliando as práticas de vida saudável, mindfullness e natureza.

Do castanho ao cerejo, mais do que nunca, é o momento para descobrir o equilíbrio, para quebrar as rotinas, para usufruir do que é bom e faz bem, para valorizar os momentos com aqueles que fazem parte do nosso nicho familiar. 

 
Ana Raquel Caldas Docente do ISAG – European Business School, 24/09/2020
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