O direito do trabalho e da segurança social nos tempos de mudança que se vivem;

O direito do trabalho e da segurança social nos tempos de mudança que se vivem


Alcides Martins

Advogado de Alcides Martins, Bandeira, Simões & Associados – Sociedade de Advogados, SP RL
Professor convidado da Universidade Europeia e do ISCTE-IUL (alcides@amartins.pt)
As estruturas jurídico-administrativas que, na atualidade, dão corpo ao direito do trabalho e da segurança social e que envolvem a generalidade dos cidadãos do mundo mais evoluído resultaram da Revolução Industrial, que, naturalmente, foi evoluindo ao longo dos últimos dois séculos, destruindo empregos, criando empregos, mas, globalmente, melhorando a vida das pessoas.
Continuando a haver máquinas, a cada dia que passa, cada vez há menos mecânica e mais telemática. O mundo digital está implantado, dominando grande parte das relações humanas. É previsível que dentro de poucos anos ninguém viverá sem utilizar os meios informáticos. Nos dias que correm, ver um jovem sem o computador de mão (a que ainda se chama telemóvel) é já uma situação inusitada.
Nas atividades laborais, são já poucas aquelas que não dependem dos instrumentos informáticos, em regra, reduzindo o número de trabalhadores e produzindo mais e melhor. Naturalmente, também estão a surgir novas atividades profissionais. Veja-se o que se está a passar nas atividades desportivas e a sua missão ao preencherem o tempo dos espetadores da radiotelevisão e, agora, também da Internet.
Estão já em causa muitas atividades humanas, muitas profissões, muitas categorias de trabalhadores e até muitos escritórios e instalações industriais.
Mas, mais do que isto, já estão em crise as ideias que orientavam as relações laborais, a começar pelo conceito basilar da própria subordinação jurídica, em que ainda assenta o nosso direito do trabalho e o sistema previdencial. Mas também o modo, o horário, e o próprio lugar do trabalho, que, como se passou a ver com a pandemia, deixarem de ser essenciais em grande parte das atividades laborais. Antes, já muito trabalho era executado, através da Internet, a desoras e em sítios remotos. No futuro próximo, ninguém duvidará que muitas empresas em diversos setores não poderão deixar de utilizar tal pessoal de países onde o direito do trabalho é uma miragem, como acontece em grande parte da Ásia.
Neste cenário de pós, Revolução Industrial e de pandemia, que não será alvo de celeuma, tornou-se premente saber que Direito do Trabalho e da Segurança Social iremos ter ou precisamos de ter. Parece de todo evidente que a flexibilidade das normas laborais, ao contrário da sua costumada imperatividade, terá que se ir construindo. Também o sistema previdencial, face ao aumento da minguante relação contribuintes/beneficiários, nomeadamente no que tange aos benefícios diferidos, tem de ser alterada, pois o financiamento será insuficiente e o Estado dificilmente poderá dispor de meios tão volumosos para o setor privado.
As forças políticas que formam a maioria legislativa que vamos tendo, e lembremo-nos que resultou da livre votação e omissão da maioria dos portugueses, continuam interessadas apenas nos votos dos trabalhadores, que constituem a maioria dos eleitores. Para tanto, preocupam-se em conceder direitos e mais direitos. As quinze das dezasseis reformas que o Código do Trabalho de 2009 já sofreu foram sempre em tal sentido. O mesmo se dirá dos projetos e proposta que estão na Assembleia da República.
A melhoria da produtividade das empresas e das condições de trabalho, nomeadamente, a subida das retribuições, pouco interessa. A própria adequação do direito por setores através das convenções coletivas também não é fonte de preocupação. Aliás, com um Código do Trabalho tão amplo e pormenorizado, para além de todos os anos ser “atualizado”, como acontece com os códigos fiscais, o campo das convenções será sempre reduzido e sem interesse de maior.
Face ao constante crescimento do nível cultural que se tem alcançado, seria interessante estudar se a constante preocupação de consagrar direitos a favor dos trabalhadores tem a correspondente contrapartida em votos. Também seria aliciante saber qual o significado da substituição na linguagem comunicacional da palavra “trabalhador” pelo vocábulo “funcionário”.
06/10/2021
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