A nacionalidade dos indivíduos que nasceram e faleceram antes da independência dos territórios ultramarinos tornados independentes;

A nacionalidade dos indivíduos que nasceram e faleceram antes da independência dos territórios ultramarinos tornados independentes


Vera Patrícia Querido
Managing Partner
da VPQ Advogados




Júnia Luíza Delgado
Consultora da Morais Leitão
O Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de junho, veio regular a questão da nacionalidade dos cidadãos nascidos nas ex-colónias e, embora seja um diploma que se encontra revogado, acaba por determinar a nacionalidade das pessoas a quem era aplicável, enquanto se encontrava em vigor.
Assim, a nacionalidade dos indivíduos que haviam nascido e faleceram antes da independência dos territórios ultramarinos tornados independentes continuou a ser a nacionalidade portuguesa, nos termos do Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de junho (entretanto revogado).
A principal regra deste diploma é a de que os cidadãos nascidos nas ex-colónias, como é o caso de Cabo Verde, foram portugueses até a data da independência de tais territórios.
Contudo, o artigo 1.º deste diploma previa situações específicas que determinavam a conservação da nacionalidade para os seguintes portugueses domiciliados em território ultramarino tornado independente:
a) Os nascidos em Portugal continental e nas ilhas adjacentes;
b) Até à independência do respetivo território, os nascidos em território ultramarino ainda sob administração portuguesa;
c) Os nacionalizados;
d) Os nascidos no estrangeiro de pai ou mãe nascidos em Portugal ou nas ilhas adjacentes ou de naturalizados, assim como, até à independência do respetivo território, aqueles cujo pai ou mãe tenham nascido em território ultramarino ainda sob administração portuguesa;
e) Os nascidos no antigo Estado da Índia que declarem querer conservar a nacionalidade portuguesa;
f) A mulher casada com, ou viúva ou divorciada de português dos referidos nas alíneas anteriores e os filhos menores deste.
Os restantes descendentes até ao terceiro grau dos portugueses referidos nas alíneas a), c), d), primeira parte, e e) acima elencadas conservam também a nacionalidade portuguesa, salvo se, no prazo de dois anos a contar da data em que se deu a independência, tiverem declarado por si, sendo maiores ou emancipados, ou pelos seus legais representantes, sendo incapazes, que não querem ser portugueses.
Conservam igualmente a nacionalidade portuguesa os seguintes indivíduos:
a) Os nascidos em território ultramarino tornado independente que estivessem domiciliados em Portugal continental ou nas ilhas adjacentes há mais de cinco anos em 25 de abril de 1974;
b) A mulher e os filhos menores dos indivíduos referidos na alínea anterior.
Ficou ao critério dos indivíduos referidos nas alíneas a) e b) referidas optarem, no prazo de dois anos a contar da data da independência, pela nova nacionalidade que lhes viesse a ser atribuída.
Todos os indivíduos nascidos ou domiciliados em território ultramarino tornado independente que não sejam abrangidos pelas disposições referida, perdem a nacionalidade portuguesa.
A acrescentar às disposições explanadas acima, para o caso dos cabo-verdianos, o Decreto-Lei n.º 71/76, de 24 de julho (Lei da Nacionalidade cabo-verdiana, pós-independência e já revogada), determinava que os domiciliados ou que nasceram em Cabo Verde e não tiverem demonstrado ter outra nacionalidade, se tornaram cabo-verdianos originários e, consequentemente, perderam a nacionalidade portuguesa.
A questão que se levanta agora é se os indivíduos que nasceram e faleceram antes de ser decretada a independência dos territórios ultramarinos, ou seja, que não perderam a nacionalidade portuguesa e nem lhes foi atribuída nova nacionalidade, poderão ser considerados portugueses.
Ora, a verdade é que a morte não implica a perda da nacionalidade, nomeadamente para os efeitos do artigo 1.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade portuguesa), pelo que um indivÍduo que nasceu nas ex-colónias e faleceu enquanto as mesmas ainda estavam sob a administração portuguesa, deve ser considerado de nacionalidade portuguesa.
Por essa razão, tendo em consideração a alínea d) do artigo 1.º da Lei da Nacionalidade portuguesa, que determina serem portugueses de origem «os indivíduos com, pelo menos, um ascendente de nacionalidade portuguesa originária do 2.º grau na linha reta que não tenha perdido essa nacionalidade, se declararem que querem ser portugueses e possuírem laços de efetiva ligação à comunidade nacional», entende-se que os filhos e netos de qualquer cidadão português das ex-colónias que não tenha perdido ou renunciado à nacionalidade, por ter falecido antes da independência, têm direito à atribuição da nacionalidade desde que consigam demonstrar a efetiva ligação à comunidade portuguesa.
A efetiva ligação à comunidade portuguesa verifica-se pelo conhecimento suficiente da língua portuguesa e depende da não condenação, com trânsito em julgado da sentença, em pena de prisão igual ou superior a três anos, por crime punível segundo a lei portuguesa, e da não existência de perigo ou ameaça para a segurança ou a defesa nacional, pelo envolvimento em atividades relacionadas com a prática do terrorismo, nos termos da respetiva lei.
21/07/2022
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