Subcontratação de serviços de consultoria imobiliária e financeira isenta de imposto;

IVA
Subcontratação de serviços de consultoria imobiliária e financeira isenta de imposto

Assunto: Serviços de gestão de fundo de investimento -Subcontratação de serviços de consultoria imobiliária e financeira.
Processo: 25924, com despacho de 2024-04-30, do Diretor de Serviços da DSIVA, por subdelegação

Conteúdo:
I - Factos apresentados e enquadramento do sujeito passivo

1. Após consulta efetuada ao Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes da Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada de “AT”), constata-se que a Requerente se encontra registada, para efeitos de IVA, para o exercício da atividade principal de “OUT. ACT.SERV. FINANC. DIV.,N.E.,EXC.SEGUROS FUNDOS PENSÕES - 64992 e secundária de “ACTIVIDADES DE GESTÃO DE FUNDOS” -CAE 66300, tendo enquadramento no regime normal mensal, como sujeito passivo misto, utilizando para efeitos do exercício do direito à dedução o método prorata (percentagem de dedução).
2. Refere que é responsável pela gestão e administração de diversos fundos de capital de risco fechado, designadamente o XP -Fundo Capital de Risco Fechado (doravante também abreviadamente designado “Fundo XP”) e o AB - Fundo de Capital de Risco Fechado (doravante também abreviadamente designado “Fundo AB”), competindo-lhe praticar todos os atos necessários à correta administração e desenvolvimento dos mesmos.
3. No contexto da sua atividade de gestão e administração dos mencionados organismos, externalizou parte dos serviços necessários e indispensáveis à gestão e administração do portfólio de ativos que integram o património dos referidos organismos de investimento.
4. Refere ainda, que em observância da política de investimento estabelecida, compete-lhe a boa administração, gestão e representação dos organismos sob a sua alçada e, bem assim, selecionar os valores que devem constituir os mesmos, adotando a prudência requerida para defesa e promoção dos referidos organismos e dos seus participantes.
5. Neste contexto, celebrou no dia 6 de maio de 2021 dois contratos com a entidade KZ Lda (doravante abreviadamente também designada de “KZ” ou “prestador de serviços”), empresa especializada na prestação de serviços de gestão de investimentos e desenvolvimento imobiliário.
6. No âmbito dos referidos contratos celebrados com a entidade KZ (que juntou ao presente pedido de informação), com vista à gestão e administração dos fundos de investimento acima mencionados (i.e. Fundo XP e Fundo AB), o prestador de serviços comprometeu-se a prestar os seguintes serviços (cf. anexo I dos referidos contratos): 1. Realizar atividades de apoio à sociedade gestora em conexão com os fundos, nomeadamente, identificar potenciais mercados, bem como investidores; 2. Elaborar estudos de mercado e identificação de oportunidades de investimento, em Portugal e no estrangeiro; 3. Realizar uma primeira análise de potenciais investimentos/seleção de potenciais investimentos; 4. Elaborar análises de mercado e viabilidades financeiras; 5. Preparar apresentações para oportunidades de investimento; 6. Apoiar a sociedade gestora na preparação de memorandos de investimento; 7. Realizar trabalhos de duediligence em relação às oportunidades de investimento; 8. Após a decisão de investimento da sociedade gestora, prestar o apoio necessário, quando solicitado por esta, nos processos de aquisição até à conclusão do investimento; 9. Atuar como administradores das sociedades participadas, se nomeados pela sociedade gestora, quando aplicável; 10. Elaborar planos de negócios; 11. Prestar serviços de consultoria de investimento; 12. Encontrar potenciais arrendatários para os imóveis, se aplicável; 13.Elaborar relatórios atualizados para cada investimento; 14. Preparar relatórios para a estratégia de desinvestimento (“exit strategy”) para cada investimento; 15. Preparar documentação e respetivas plataformas de acesso (“data room”) para potenciais investidores; 16. Tratar das relações com corretores e intermediários para encontrar potenciais compradores;
17. Identificar oportunidades de venda; e, 18. Fornecer o suporte necessário, se solicitado e quando aplicável, nos casos de decisões de desinvestimento.
7. Salienta, que em contrapartida da prestação da totalidade dos serviços supra elencados, a KZ fatura à Requerente uma comissão calculada em função do capital angariado e do número de investidores de cada Fundo, a qual é composta por uma comissão anual com uma componente fixa e com uma componente variável.
8. O prestador de serviços tem vindo a enquadrar os referidos serviços enquanto uma operação sujeita a IVA e não dele não isenta, emitindo as correspondentes faturas à Requerente com a respetiva liquidação do imposto, à taxa normal de 23%.
9. Não obstante, entente que os serviços adquiridos à KZ de consultoria e assessoria imobiliária e financeira destinados à gestão de fundos de investimento, estão isentos de IVA, uma vez que se encontram preenchidos os requisitos de aplicação estatuídos pelo artigo 9.º, alínea 27), subalínea g) do Código do IVA (adiante designado de “CIVA”), pelo que pretende a sua confirmação.
10. Da consulta ao contrato de prestações de serviços submetido no presente pedido de informação, celebrado entre a Requerente, nele designado de “PA” e a KZ, LDA, NIF 515xxxyyy, nela designada de (o “Prestador de Serviços”) e para o caso em análise, retira-se o seguinte: “ CONSIDERANDO QUE
I. PA é uma empresa de gestão de fundos de capital de risco, registada na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários Portuguesa como uma “SCR - Sociedade de Capital de Risco”, desde 1x de agosto de 202x;
II. O Prestador de Serviços é uma empresa dedicada à compra e venda de ativos imobiliários e à revenda dos imóveis adquiridos para esse fim, desenvolvimento imobiliário, consultoria, gestão de projetos imobiliários, marketing de produtos imobiliários, projetos e montagem de investimentos imobiliários, bem como gestão e arrendamento de ativos imobiliários próprios ou de terceiros;
III. No contexto da gestão de fundos, o Prestador de Serviços também fornece serviços de consultoria em gestão para empresas de gestão de fundos;
V. A PA lançou o XP FUND FCR (o “Fundo”) e gostaria de levantar até Eur. 150 milhões em capital para o Fundo. Para alcançar esse valor, a PA precisaria ter uma exposição global e precisará da assistência do Prestador de Serviços, devido à sua experiência em pesquisa de mercado e identificação de mercados e investidores relevantes, para alcançar o montante mencionado.
VI.A PA está interessada em contratar o Prestador de Serviços para fornecer serviços de apoio.
VII. O Prestador de Serviços está interessado em fornecer os serviços mencionados.
VIII. As Partes estão interessadas em definir os termos e condições de um acordo de serviços, sem prejuízo da necessidade de a atuação do Prestador de Serviços estar sujeita a controlo pela PA. Portanto, confiando na precisão e veracidade destes considerandos, as Partes concordaram em executar este acordo de serviços (o “Acordo”) livremente e de boa fé, regido pelos considerandos acima e pelas seguintes cláusulas.
CLÁUSULAS
1. OBJETO 1.1.A PA, como empresa de gestão do Fundo, está vinculada a gerenciar o Fundo nos termos da legislação e regulamentação aplicáveis, bem como do regulamento de gestão respectivo.
1.2. Sujeito aos termos e condições estabelecidos neste Acordo, o Prestador de Serviços concorda em fornecer os serviços descritos no Anexo I (os “Serviços”) e a PA aceita a prestação desses Serviços pelo Prestador de Serviços.
1.3.Os Serviços serão prestados pelo Prestador de Serviços à PA em conexão com o Fundo acima mencionado gerido pela PA. ()
11. Da consulta ao outro contrato de prestações de serviços também submetido no presente pedido de informação, igualmente celebrado entre a Requerente e a KZ, verifica-se que foi celebrado nos mesmos termos e condições do anterior tendo como única diferença que a KZ irá prestar pesquisa e identificação de mercado e serviços de consultoria num outro fundo administrado e gerido pela Requerente, o fundo “AB FCR”. II - Enquadramento da atividade apresentada face ao Código do IVA
12. Tendo presente o conteúdo funcional dos serviços a que alude a Requerente no seu pedido de informação vinculativa importa analisar se, conforme é defendido pela própria, a aquisição de serviços de consultoria e acessória imobiliária e financeira destinados à gestão de fundos de investimento geridos pela mesma, está abrangida no âmbito de incidência da isenção prevista no artigo 9.º, alínea 27), subalínea g) do CIVA.
13. O artigo 9.º, alínea 27), subalínea g), do CIVA estabelece que estão isentas de IVA as seguintes operações: “() A administração ou gestão de fundos de investimento;”.
14. Esta norma resulta da transposição para o ordenamento jurídico nacional do artigo 13.º, B, alínea d), n.º 6, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema Comum do Imposto Sobre o Valor Acrescentado: matéria coletável uniforme (adiante designada “Sexta Diretiva”), cuja redação foi retomada, sem alteração significativa, pelo artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA.
15. Segundo jurisprudência constante do TJUE, as isenções previstas no artigo 135.º da Diretiva IVA (e no artigo 13.º da Sexta Diretiva, que a antecedeu) constituem conceitos autónomos do direito comunitário e devem, portanto, ser objeto de uma definição comunitária, que tenha por objetivo evitar divergências na aplicação do regime do IVA de um Estado-Membro para outro. Ver, por exemplo, o Acórdão proferido no Processo C-169/04, em 04 de maio de 2006 (Abbey National plc.).
16. Isto é, com exceção dos casos em que o legislador comunitário expressamente atribui aos Estados-Membros o poder de preencher os conceitos abrangidos pelas isenções, aqueles conceitos devem ser interpretados como conceitos autónomos de direito comunitário, ou seja, são objeto de uma definição comunitária.
17. No mesmo Acórdão, o TJUE esclarece que, embora os Estados-Membros não possam alterar o seu conteúdo, em especial quando fixam as respetivas condições de aplicação, não pode ser esse o caso quando a norma comunitária confia precisamente a esses Estados a definição de determinados termos de uma isenção. Razão pela qual, o citado Acórdão analisa se a norma em análise -à data dos factos, o artigo 13.º, B, alínea d), n.º 6 da Sexta Diretiva -atribui aos Estados-Membros o encargo de definirem quer o conceito de fundos comuns de investimento quer de gestão desses fundos ou se visa unicamente o primeiro desses dois conceitos.
18. No que diz respeito ao alcance do conceito de «gestão de fundos comuns de investimento» previsto no artigo 13.° B, alínea d), n.º 6, da Sexta Diretiva, o TJUE conclui que o conceito de «gestão de fundos comuns de investimento», previsto na citada norma, constitui um conceito autónomo do direito comunitário cujo conteúdo não pode ser modificado pelos Estados-Membros.
19. Importa, neste ponto, a propósito da densificação do conteúdo de «gestão de fundos comuns de investimento», referir, seguindo a jurisprudência reiterada do TJUE, que as isenções previstas nas normas em referência são de interpretação estrita, dado que constituem derrogações ao princípio geral segundo o qual o IVA é cobrado sobre qualquer prestação de serviços efetuada a título oneroso por um sujeito.
20. O citado Acórdão AbbeyNational esclarece que a finalidade da isenção das operações no contexto da gestão de fundos de investimento prevista no artigo 13.º, B, alínea d), n.º 6, da Sexta Diretiva é, nomeadamente, facilitar aos pequenos investidores a aplicação de capital em fundos de investimento. O n.º 6 desta disposição visa assegurar que o sistema comum do IVA seja fiscalmente neutro quanto à opção entre o investimento direto em títulos e o que é feito por intermédio de organismos de investimento coletivo -adiante designados de “OIC” - (cf. ponto 62 do Acórdão). Daí decorre que as operações abrangidas por esta isenção sejam as que são específicas à atividade dos OIC (cf. ponto 63 do Acórdão). Ao invés, esta disposição não visa as funções de depositário dos OIC, uma vez que fazem parte do controlo e fiscalização e não da gestão dos organismos de investimento público.
21. Também neste Acórdão o TJUE já se pronunciou que cabem no âmbito da aplicação do artigo 13.° B, alínea d), n.º 6, da Sexta Diretiva as funções de gestão da carteira de títulos, as de administração dos próprios OIC, que são funções específicas dos próprios. (cf. ponto 64 do Acórdão AbbeyNational)
22. Quanto aos serviços de gestão administrativa e financeira dos fundos prestados por um gestor terceiro, há que referir que, como para as operações isentas ao abrigo do artigo 13.º B, alínea d), n.ºs 3 e 5, da Sexta Diretiva, a gestão de fundos comuns de investimento é definida em função da natureza das prestações de serviços que são fornecidas e não em função do prestador ou do destinatário do serviço. (cf. ponto 66 do Acórdão)
23. O mesmo Acórdão esclarece que resulta do princípio da neutralidade fiscal que os operadores devem poder escolher o modelo de organização que, do ponto de vista estritamente económico, melhor lhes convém, sem correrem o risco de ver as suas operações excluídas da isenção. (cf. ponto 68 do Acórdão)
24. Contudo, na decisão proferida, em 02 de julho de 2020, no Processo C-231/19 [Blackrock Investment Management (UK) ltd], o TJUE recordou, que o princípio da neutralidade fiscal é uma regra de interpretação da Diretiva IVA e não uma norma de nível superior às disposições da Diretiva, que não permite alargar o âmbito de aplicação de uma isenção e, consequentemente, tornar aplicável o artigo 135.º, n.º 1, alínea g) da Diretiva IVA a uma prestação, como a que estava em causa no processo principal, que não preencha os seus requisitos. (cf. ponto 51 do Acórdão)
25. Ou seja, o TJUE deixa claro, que o princípio da neutralidade fiscal sendo uma regra de interpretação, não serve de fundamento para alargar o âmbito de aplicação das normas a situações em que os requisitos dessas normas não se encontrem integralmente preenchidos.
26. O mesmo Acórdão, no que respeita à prestação de gestão de carteiras de títulos, também clarificou que “é uma prestação única, constituída por uma prestação de análise e de supervisão do património do cliente investidor e por uma prestação de compra e de venda de títulos, ambas igualmente indispensáveis para a realização da prestação global (v., neste sentido, Acórdão de 19 de julho de 2012, Deutsche Bank, C 44/11, EU:C:2012:484, n.os 26 e 27).” (cf. ponto 34 do Acórdão)
27. No que diz respeito à possibilidade de os serviços de gestão de fundos comuns de investimento, serem prestados por um terceiro e, ainda assim, abrangidos pelo âmbito de aplicação da isenção em referência, o TJUE considera que deve entender-se que, contando que os serviços prestados se refiram a elementos específicos essenciais da gestão de fundos comuns de investimento, tais serviços devem estar englobados na isenção em referência. A simples prestação material ou técnica, como por exemplo a colocação de um sistema informático à disposição dos fundos comuns de investimento, já não se consideram abrangidos, por não serem específicos à gestão dos fundos. (cf. ponto 71 do Acórdão Abbey National)
28. O Tribunal já se pronunciou indicando que o artigo 13.º, B, alínea d), n.º 6, da Sexta Diretiva deve ser interpretado no sentido de que os serviços de gestão administrativa e contabilística dos fundos prestados por um gestor terceiro são abrangidos pelo conceito de «gestão de fundos comuns de investimento» na aceção desta disposição se formarem um conjunto distinto, apreciado em termos globais, e se forem específicos e essenciais para a gestão de fundos comuns de investimento. (cf. ponto 72 do Acórdão AbbeyNational)
29. Mais recentemente, no Acórdão proferido, em 17 de junho de 2021, nos processos apensos C-58/20 e C-59/20 (Acórdão K e DBKAG), que começa por esclarecer, caso subsistissem dúvidas, “(a) título preliminar, há que salientar que, na medida em que a Diretiva IVA revoga e substitui a Sexta Diretiva, a interpretação fornecida pelo Tribunal de Justiça no que respeita às disposições desta última diretiva é igualmente válida para as da Diretiva IVA, quando as disposições destes dois instrumentos de direito da União possam ser qualificadas de equivalentes”. (cf. ponto 27 do Acórdão)
30. A interpretação fornecida pelo TJUE no que respeita ao artigo 13.º, B, alínea d), ponto 6, da Sexta Diretiva é igualmente válida para o artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA, uma vez que, estas disposições estão redigidas em termos substancialmente idênticos e podem, portanto, ser qualificadas de equivalentes.
31. Assim, o TJUE retoma, neste Acórdão, sem novidade, os argumentos sobre a interpretação das normas de isenção.
32. Em primeiro lugar, o TJUE recorda, à luz da jurisprudência citada, que para saber se prestações de serviços fornecidas por terceiros a sociedades de gestão de fundos comuns de investimento são abrangidas pela isenção prevista no artigo 135.º, n. º 1, alínea g), da Diretiva IVA, importa apreciar se esses serviços formam um conjunto distinto, apreciado de modo global.
33. A este respeito, há que observar que o requisito relativo ao caráter «distinto» não pode ser interpretado no sentido de que, para ser abrangida pela isenção prevista no artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA, uma prestação de serviços, específica e essencial à gestão de fundos comuns de investimento, deve ser totalmente externalizada.
34. Esclarece o Acórdão em referência, no seu ponto 39, que “(), se uma prestação específica e essencial à gestão de fundos comuns de investimento tiver de ser sujeita a IVA pelo simples facto de não ser totalmente externalizada, tal favorece as sociedades de gestão que fornecem elas próprias essa prestação e os investidores que colocam diretamente o seu dinheiro em títulos sem recorrer a prestações de gestão de fundos (v., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2014, ATP Pension Service, C 464/12, EU:C:2014:139, n.º 72 e jurisprudência referida).”
35. Esclarece ainda o mesmo Acórdão “Com efeito, o anexo II da Diretiva OICVM prevê que a atividade de gestão coletiva de carteiras inclui, nomeadamente, funções de administração como serviços jurídicos e de contabilidade de gestão do fundo e a avaliação da carteira e determinação do valor das unidades de participação (incluindo declarações fiscais).” (cf. ponto 47 do Acórdão)
36. Assim, conclui-se que “50 () são abrangidos pelo conceito de «gestão» de um fundo comum de investimento na aceção do artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA não apenas a gestão de investimentos que implica a escolha e a cessão de ativos que são objeto dessa gestão mas também as prestações de administração e de contabilidade, como o cálculo do montante dos rendimentos e do preço das unidades de participação ou ações do fundo, as avaliações de ativos, a contabilidade, a elaboração de declarações para a distribuição dos rendimentos, a prestação de informações e o fornecimento de documentação para os efeitos de prestação periódica de contas, de declarações de impostos, de estatística e de IVA, bem como a elaboração de previsões de rendimentos (v., neste sentido, Acórdão de 7 de março de 2013, GfBk, C 275/11, EU: C:2013:141, n.º 27). 51 Em contrapartida, as prestações que não são específicas da atividade de um fundo comum de investimento, mas inerentes a todos os tipos de investimento, não cabem no âmbito de aplicação deste conceito de «gestão» de um fundo comum de investimento (v., neste sentido, Acórdão de 9 de dezembro de 2015, Fiscal e Eenheid X, C 595/13, EU:C:2015:801, n.º 78).”
37. Sublinha, ainda, o mesmo Acórdão que “58 Por conseguinte, resulta do exposto que prestações de serviços, como tarefas fiscais que consistem em assegurar que os rendimentos do fundo obtidos pelos participantes são tributados de acordo com a lei nacional e a cedência de um direito de utilização de um software destinado a efetuar cálculos essenciais à gestão do risco e à avaliação do desempenho, são abrangidas pela isenção prevista no artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA, desde que tenham um nexo intrínseco com a gestão de fundos comuns de investimento e sejam exclusivamente fornecidas para efeitos da gestão desses fundos. () 62 Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que prestações de serviços fornecidas por terceiros a sociedades de gestão de fundos comuns de investimento, como tarefas fiscais que consistem em assegurar que os rendimentos do fundo obtidos pelos participantes são tributados de acordo com a lei nacional e a cedência de um direito de utilização de um software exclusivamente destinado a efetuar cálculos essenciais à gestão do risco e à avaliação do desempenho, são abrangidas pela isenção prevista nessa disposição, desde que tenham um nexo intrínseco com a gestão de fundos comuns de investimento e sejam exclusivamente fornecidas para efeitos da gestão desses fundos, independentemente de serem totalmente externalizadas.”
38. Relativamente ao requisito relativo ao caráter específico e essencial do serviço, importa para determinar se as prestações fornecidas por um terceiro a uma sociedade de gestão são abrangidas pela isenção prevista no artigo 135.º, n.º 1, alínea g), da Diretiva IVA, investigar se o serviço prestado por esse terceiro tem um nexo intrínseco com a atividade específica de uma sociedade de gestão, de tal forma que tenha o efeito de preencher as funções específicas e essenciais da gestão de um fundo comum de investimento (v., neste sentido, Acórdão de 7 de março de 2013, GfBk, C 275/11, EU:C: 2013:141, n.º 23).
39. No referido Acórdão GfBk, o TJUE pronunciou-se no sentido de que “O facto de os serviços de consultoria e informação não estarem enumerados no anexo II da Diretiva 85/611, conforme alterada pela Diretiva 2001/107, não obsta à sua inclusão na categoria dos serviços específicos abrangidos pelas atividades de «gestão» de um fundo comum de investimento na aceção do artigo 13.°, B, alínea d), n.° 6, da Sexta Diretiva, pois o próprio artigo 5.°, n.° 2, da Diretiva 85/611, conforme alterada pela Diretiva 2001/107, sublinha que a lista do dito anexo não é «exaustiva»” (cf. ponto 25 do Acórdão). Acrescentado ainda que “Importa ainda salientar que a inclusão dos serviços de consultoria e de informação na categoria dos serviços específicos abrangidos pela «gestão» de um fundo comum de investimento, na aceção do artigo 13.°, B, alínea d), n.° 6, da Sexta Diretiva, não colide com o princípio da neutralidade fiscal pelo facto de os serviços de consultoria prestados a pessoas singulares ou coletivas que investem diretamente o seu dinheiro em títulos ficarem sujeitos a IVA. (cf. ponto 29 do Acórdão)
40. A propósito do que se entende “nexo intrínseco, o Advogado Geral, nas suas Conclusões no Acórdão GfBk, referiu que o requisito exigido se refere a uma vinculação intrínseca entre um serviço e a atividade desenvolvida por um fundo comum de investimento. Em suma, trata-se de individualizar as prestações que são próprias de um fundo comum de investimento e que a distinguem, neste aspeto, de outras atividades económicas. Deu como um simples exemplo, o cálculo de unidades de participação e ações do fundo ou uma proposta de compra ou venda de ativos que é uma atividade própria de um fundo comum de investimento, mas não de uma empresa de construção civil.É óbvio que nada impede uma empresa construtora de levar a cabo atividades de investimento financeiro, mas estas não são características ou próprias, e nesse sentido específicas, do setor da construção.
41. Também referiu que, em contrapartida, um serviço de assistência técnica a equipamentos informáticos ou mesmo um serviço de limpeza, podem ser prestados indiferentemente a uma sociedade de gestão de fundos ou a uma empresa do setor da construção, sem que possa afirmar se que se trata de um serviço específico de qualquer das duas. Seriam, por assim dizer e se quisermos usar a expressão, serviços neutros ou fungíveis do ponto de vista do conteúdo, na medida em que podem ser fornecidos de modo totalmente indiferente a umas e outras empresas.
42. Realce-se, ainda, que quanto ao conceito de “fundos comuns de investimento” para efeitos de aplicação da isenção em análise, no Acórdão proferido no Processo C 595/13, em 9 de dezembro de 2015 (Staatssecretaris van Financiën.), o TJUE declarou que “devem ser considerados fundos comuns de investimento isentos na aceção dessa disposição, por um lado, os investimentos abrangidos pela diretiva OICVM e sujeitos, nesse âmbito, a uma supervisão específica por parte do Estado e, por outro, os fundos que, não sendo organismos de investimento coletivo na aceção dessa diretiva, têm características semelhantes a estes e efetuam as mesmas operações, ou, pelo menos, têm características de tal forma comparáveis que se encontram numa relação de concorrência com eles” (cf. ponto 47 do Acórdão)
43. Concluindo no mesmo Acórdão o TJUE que “apenas os investimentos sujeitos a supervisão específica por parte do Estado podem estar sujeitos às mesmas condições de concorrência e dirigir se ao mesmo círculo de investidores. Portanto, estes outros tipos de fundos de investimento podem, em princípio, beneficiar da isenção prevista no artigo 13.°, B, alínea d), ponto 6, da Sexta Diretiva se os Estados Membros também previrem a seu respeito uma supervisão específica por parte do Estado”. (cf. ponto 48 do Acórdão)
44. Considerando o que antecede pode concluir-se, em resumo, que as isenções, em sede de IVA, devem ser interpretadas:
a) De forma estrita;
b) Enquanto conceitos autónomos de direito europeu;
c) Atendendo à natureza da prestação de serviços e não às características ou qualidade do prestador.
45. Pode, ainda, concluir-se, em geral, que as atividades desenvolvidas por terceiros, a quem a sociedade gestora delegue funções que eram inicialmente da sua competência, derivadas do vínculo jurídico que a une ao fundo de investimento, ou seja, de gestão do mesmo, estão abrangidas pela isenção do IVA em causa na medida em que a administração ou gestão do fundo esteja abrangida e desde que reúnam as características a que aludem os Acórdãos em referência, isto é, tenham um carácter distinto ou autónomo, bem como um nexo intrínseco com a gestão de fundos comuns de investimento e sejam exclusivamente fornecidas para efeitos da gestão desses fundos.
46. Assim, em consonância com a argumentação aduzida pelo TJUE nos Acórdãos mencionados, atividades como gestão corrente de ativos dos fundos de investimento, serviços contabilísticos, serviços jurídicos ou serviços de consultoria, devem considerar-se no âmbito da isenção de IVA prevista no artigo 9.º, alínea 27), subalínea g), do CIVA, porquanto constituem operações essenciais e específicas da sua atividade, independentemente de serem desenvolvidas por entidade diferente da que está, no geral, encarregue de efetuar a gestão. De modo contrário, as simples prestações de serviços, que não estão relacionadas diretamente com a gestão do fundo de investimento, nem são específicas da atividade de gestão desse fundo, sendo, ao invés, gerais em relação a qualquer entidade que desenvolva qualquer tipo de atividade económica, não são englobadas nessa isenção.
47. Feita esta breve análise sobre o entendimento que o TJUE preconiza na isenção prevista no artigo 9.º, alínea 27), subalínea g), do CIVA, não é ainda possível responder concretamente à questão colocada pela Requerente sem antes fazer referência à legislação nacional, no que se refere aos OIC.
48. De acordo com o artigo 2.º do Regime de Gestão de Ativos (adiante designado “RGA”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 27/2023, de 28 de abril, diploma que regula a atividade dos OIC e que transpôs para a ordem jurídica interna, designadamente, as Diretivas 2009/65/CE de 13 de julho de 2009 e 2011/61/UE de 8 de junho de 2011, ambas do Parlamento Europeu e do Conselho, os «organismos de investimento coletivo» (OIC) são instituições dotadas, ou não, de personalidade jurídica, que têm como fim o investimento coletivo de capitais obtidos junto de investidores de acordo com uma política de investimento previamente estabelecida.
49. Os OIC assumem, nos termos do artigo 3.º do RGA, a forma: societária de sociedade de investimento coletivo; ou contratual, de fundo de investimento, consoante tenham, ou não, personalidade jurídica.
50. Face ao previsto nos artigos 5.º e 208.º, n.º 1 do mesmo diploma os OIC adotam duas tipologias, os organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) e os organismos de investimento alternativo (OIA). Estes últimos podem ainda ter as seguintes tipologias: a) O investimento em ativos imobiliários, designados OIA imobiliário; b) O investimento em capital de risco, designados OIA de capital de risco; c) O investimento em créditos, designados OIA de créditos; e d) O investimento em valores mobiliários ou em outros ativos financeiros ou não financeiros, incluindo nos ativos permitidos aos tipos de OIA mencionados nas alíneas anteriores.
51. Dessa forma, verifica-se que os fundos de investimento são uma das tipologias de OIC, podendo ainda subdividirem-se conforme exposto no ponto anterior.
52. A gestão de um OIC está a cargo de «sociedades gestoras», nos termos do artigo 6.º do RGA.
53. As funções das sociedades gestoras de OIC estão enunciadas no artigo 63.º do RGA, estando prevista, no artigo 70.º do mesmo diploma, a possibilidade de subcontratação de funções no âmbito da gestão de OIC, dependendo de comunicação prévia à CMVM.
54. De acordo com o artigo 63.º, n.º 2 do RGA, no exercício das funções respeitantes à gestão de OIC, a sociedade gestora:
a) Gere o investimento;
b) Gere o risco;
c) Administra o OIC, em especial:
i) Presta os serviços jurídicos e de contabilidade; ii) Esclarece e analisa as questões e reclamações dos participantes; iii) Avalia a carteira, determina o valor das unidades de participação e emite declarações fiscais; iv) Cumpre e controla a observância das normas aplicáveis e dos documentos constitutivos dos organismos de investimento coletivo; v) Procede ao registo dos participantes; vi) Distribui rendimentos; vii) Emite, resgata ou reembolsa unidades de participação; viii) Efetua os procedimentos de liquidação e compensação, incluindo o envio de certificados; ix) Regista e conserva os documentos;
d) Comercializa as unidades de participação dos OIC coletivo sob gestão.
55. E de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo, a sociedade gestora, no exercício das funções respeitantes à gestão do OIA: a) gere instalações e presta serviços de administração imobiliária; b) presta aconselhamento de empresas sobre a sua estrutura de capital, estratégia comercial e assuntos conexos; c) presta aconselhamento e serviços na área das fusões e aquisições de empresas e outros serviços relacionados com a gestão do OIA e das empresas e outros ativos em que o mesmo tenha investido.
56. Quanto à subcontratação, que conforme já referido depende de comunicação prévia à CMVM, face ao estipulado no n.º 2 do artigo 70.º do RGA, a sociedade gestora:
a) Envia o projeto de contrato de subcontratação à CMVM;
b) Demonstra toda a estrutura de subcontratação com base em razões objetivas;
c) Demonstra que a entidade subcontratada é qualificada e competente para desempenhar as funções subcontratadas de modo fiável, eficaz e profissional e que foi selecionada com a máxima diligência e competência.
57. O n.º 4 do mesmo artigo 70.º prevê, ainda, que a entidade subcontratada: (a) fica sujeita aos mesmos deveres a que está sujeita a «sociedade gestora», nomeadamente para efeitos de supervisão; e (b) dispõe de recursos suficientes para exercer as respetivas funções e as pessoas que conduzem efetivamente as suas atividades têm idoneidade e experiência comprovadas.
58. Da pesquisa ao sitio na internet da CMVM -www.cmvm.pt - é possível verificar, na consulta às “sociedades gestoras”, que consta a sociedade PA SCR, S.A. NIF 515xxx (Requerente), como tipo de entidade “Sociedade de Capital de risco”.
59. No mesmo sitio também é possível verificar, na consulta aos “Fundos de investimento OIC”, que constam os seguintes fundos de capital de risco: Fundo XP ­Fundo de Capital de Risco Fechado, código do fundo: 17xx, código ISIN: PTSFxe AB ­Fundo de Capital de Risco Fechado, código do fundo: 16xx. Estes dois fundos apresentam como entidade gestora a PA SCR, S.A.
60. Aqui chegados, na situação concretamente apresentada, a Requerente questiona se a aquisição de serviços de consultoria e assessoria imobiliária e financeira destinados à gestão de fundos de investimentos (OIC) geridos pela própria, estão contemplados na isenção prevista no artigo 9.º, alínea 27), subalínea g) do CIVA, que se refere a administração e gestão dos fundos de investimento.
61. Face ao anteriormente apresentado, quer a Requerente (sociedade gestora) quer os fundos de investimento por si geridos/administrados, fundos de capital de risco (que são uma das tipologias dos OIA), estão sujeitos às normas do RGA e à supervisão da CMVM, pelo que podem ser englobados no conceito de fundo de investimento para efeitos de aplicação da norma de isenção em referência. No entanto, importa ainda concretizar se os serviços adquiridos pela Requerente, estão contemplados no âmbito da gestão dos OIC, para efeitos da norma de isenção prevista no artigo 9.º, alínea 27), subalínea g) do CIVA.
62. Considerando todo o exposto no ponto 10 da presente informação, a Requerente vai contratar à KZ, entidade que é especializada em ativos imobiliários e no contexto da gestão de fundos, serviços de consultoria (pesquisa de mercado e identificação de mercados e investidores relevantes, etc) necessários à gestão dos fundos de capital de risco, face ao vínculo jurídico que a une aos fundos em questão.
63. Dessa forma, constata-se nos serviços contratados, que existe um nexo intrínseco com a gestão corrente dos dois fundos de capital de risco (OIC), dado que os mesmos se referem a elementos específicos e essenciais da sua gestão e foram exclusivamente fornecidos para esse efeito, estando em consonância com a argumentação aduzida pelo TJUE nos Acórdãos mencionados na presente informação, respeitando também o estabelecido no artigo 63.º do RGA.
64. Face a tudo o exposto, os serviços subcontratados pela Requerente à KZ, como os que constam nos contratos de prestação de serviços fornecidos no presente pedido, no pressuposto que também estão em conformidade com as condições previstas no artigo 70.º do RGA, podem beneficiar da isenção prevista no artigo 9.º, alínea 27), subalínea g), do CIVA.

Rosa Ribeiro, 14/06/2024
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